Igreja
Evangélica Luterana Cristo – Juína
Pr.
Edenilson Gass
Sl 22; Is 52.13-53.12; Hb
4.14-16; 5.7-9; Jo 18-19 – Sexta-feira
Santa B 2015
Cristo, o exemplo dos mártires e
da Igreja Cristã
Cap. 18, v. 11: “Mas
Jesus disse... não beberei, porventura, o cálice que o Pai me deu?”
No dia 15 de
fevereiro, toda a Igreja Cristã voltou os olhos para a Líbia onde vinte e um
cristãos coptas foram mortos por ordem do Estado Islâmico. Em 17 de janeiro,
sete igrejas foram queimadas no Níger. Janeiro de 2013: Perseguição à Igreja
Cristã na Coréia do Norte se intensifica. Uma outra reportagem também diz que,
em 2012, metade do número de pessoas mortas por motivos religiosos aconteceu na
Nigéria, onde mercenários muçulmanos recebiam US$ 43,00 por cada cristão morto.
E ainda, só para
termos uma noção mais geral sobre a perseguição cristã no mundo, o site
persecution.org diz atualmente que cerca de 200 milhões de cristãos sofrem
perseguição. E uma reportagem do Vaticano constatou que mais de cem mil
cristãos são mortos todos os anos, fazendo uma média de uma morte a cada dez
minutos. O motivo na grande maioria desses casos: ser cristão.
Os números são
realmente assustadores e nós não podemos fazer de conta que isso não nos diz
respeito. São milhares de irmãos e irmãs na fé que diariamente são perseguidos,
torturados, mortos por confessarem a sua fé cristã enquanto nós vivemos em um
país onde temos plena liberdade religiosa e todas as oportunidades de
testemunhar a nossa fé. Temos, no mínimo, o dever de orar por essas pessoas.
Seja como for, a
pergunta que não cala é sempre a mesma: Por que Deus permite? Por que Deus
permite que os seus filhos sejam perseguidos, rejeitados, torturados e mortos?
Na verdade, muitos cristãos só não encontraram a resposta a esse tipo de
pergunta porque ainda não abriram a Bíblia para procurar por ela.
Quando Jesus estava
reunido com os apóstolos, conforme o evangelho de João, capítulo 15, versículo
20, ele disse: “Não é o servo maior do que seu senhor. Se me perseguiram a mim,
também perseguirão a vós outros”. E essa é a razão porque Pedro escreveu na sua
primeira carta o seguinte: “Amados, não estranheis o fogo ardente que surge no
meio de vós... como se alguma cousa extraordinária vos estivesse acontecendo”;
“Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em
vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos” (1Pe 4.12;
2.21).
O cristão, por estar
unido com Cristo Jesus, automaticamente acaba compartilhando também do seu
sofrimento. Quando um cristão sofre, Pedro diz, não pensem que isso é uma coisa
estranha. Estranho é quando o cristão não sofre porque existe a grande
possibilidade de ele não estar vivendo e confessando a sua fé cristã.
Sim, Deus permite o
sofrimento sobre o cristão. Só ele não faz isso como castigo, muito menos tem
prazer no sofrimento dos seus filhos, Deus traz o sofrimento para nos manter na
fé naquele que sofreu em nosso lugar. E quando, na sua eterna sabedoria, decide
que alguém precisa morrer por esta fé para nos fortalecer no nosso testemunho e
exemplo como cristãos, assim ele permite.
Há poucas semanas, em
vista desses acontecimentos dos quais falamos há pouco, o Dr. William Weinrich,
professor de um dos nossos seminários nos Estados Unidos, escreveu um artigo sobre
o martírio cristão. E ali ele disse uma grande verdade que, às vezes, passa
despercebida. Ele diz: Embora nossa teologia possa nos ensinar que estamos a
viver a teologia da cruz, nossa experiência de sermos cristãos no mundo diz o
contrário, afinal, muito pouco temos sofrido por sermos cristãos. E se isso não
é uma verdade no mundo todo, pelo menos é em alguns lugares como o Brasil.
Numa linguagem bem
coloquial, aqui no Brasil nós vivemos na mamata. É muito fácil ser cristão no
Brasil e talvez até por isso que nós nos acomodamos tanto, porque é bom viver
um discipulado sem cruz. Só que tem um problema: não existe discipulado sem
cruz. A não ser que Deus, por sua bondade está nos poupando de sofrer, ou nós
realmente não estamos vivendo e confessando a nossa fé.
E se essa é a questão,
então nós estamos em grande perigo. Jesus diz assim: “Todo aquele que me
confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai, que
está nos céus; mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei
diante de meu Pai, que está nos céus” (Mt 10.32-33).
No mesmo artigo sobre
martírio cristão, o Dr. Weinrich traz vários relatos de cristãos que morreram
como mártires. A gente fica impressionado quando lê aquilo por causa da coragem
dos mártires, pena que seria cansativo trazer todos os relatos agora. Mas pelo
menos um deles merece a nossa atenção.
Vamos lembrar do que aconteceu
com Perpetua, em Roma, por volta do ano 202. Mulher jovem, de família nobre, é
convertida ao cristianismo. Quando acusada publicamente pelo governo romano de
haver cometido o crime de crer em Jesus, o pai dela faz de tudo para que ela
renegue essa fé: Pensa nos teus irmãos, na tua mãe, no teu filho. Por fim, o
próprio governador pede que ela negue a sua fé para que não seja morta. Mas
diante da pergunta “tu és cristã?”, ela responde christiana sum – eu sou cristã! Ela acaba de assinar a sua sentença
de morte. Mas não nega a sua fé.
O que Perpetua fez não
foi nada mais do que atender ao que Jesus ensinou: “Quem ama seu pai ou sua mãe
mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do
que a mim não é digno de mim” (Mt 10.37).
Christianus sum não é uma mera declaração de que fulano de tal
pertence a um grupo religioso cristão. Muito mais do que isso. É a maneira do
mártir perguntar ao mundo: Quem realmente tem o poder para tirar ou dar a vida?
Aparentemente as
autoridades têm esse poder. Afinal, a vida de Perpetua e de tantos outros
estiveram nas mãos de governos terrenos que podiam tanto condená-los como
salva-los. Mas não é assim. Eles podiam até ter o poder para tirar a vida – se
Deus o permitisse – mas jamais teriam o poder para dar a vida.
A vida, o maior
presente que Deus dá ao ser humano, está nas mãos de Deus. Só ele pode dar a vida.
Por isso, na grande maioria das vezes, os mártires não enfrentavam as
autoridades dizendo: Podem me matar, um dia eu vou ressuscitar. Mas eles
diziam: Podem me matar, mas eu não posso negar aquele que é o Deus Criador.
Ou seja, eles não
enfrentavam a morte firmados na ressurreição, o que seria, de certa forma, uma atitude
egoísta. Eles enfrentavam a morte simplesmente porque Deus é seu Criador. Em
outras palavras ainda: mesmo que não houvesse ressurreição, nem Juízo final,
nem salvação, ainda assim as palavras do cristão mesmo diante da morte sempre
devem ser “eu sou cristão”!
Ser cristão no mundo é
estar em constante conflito. Aqui não há terreno neutro. Ou nossa vida é um
sacrifício aos deuses deste mundo (dinheiro, prazer) ou ao único e verdadeiro
Deus; ou estamos a confessar Cristo ou a nega-lo; prontos para viver ou para
morrer.
No entanto, aquele que
prefere viver do que confessar a sua fé cristã, entra na morte; mas o que
prefere morrer do que negar o seu salvador, entra na vida. Como o próprio Jesus
diz: “Quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha
causa achá-la-á” (Mt 16.25).
E esta é a esperança
do cristão: saber que, quer vivamos, quer morramos, somos do Senhor. Porque
Deus não é Deus de mortos e sim de vivos.
O cristão precisa
estar consciente de que tudo o que é deste mundo, por melhor que seja ou
pareça, é temporário. Amar o mundo é amar o que é temporário e abrir mão
daquilo que é permanente: a vida eterna.
Jesus é e sempre vai
ser o nosso grande exemplo. Pois ele, apesar da tamanha dor que sentia, sempre
de novo se colocava debaixo da vontade do Pai, mesmo que essa vontade
implicasse em futura crucificação. Se era esse o cálice que o Pai lhe deu para
beber, era esse o cálice que ele iria beber.
No século IV (quatro)
Agostinho fez uma pregação lembrando aqueles que morreram como mártires. Entre
eles, Perpetua. As palavras de Sto. Agostinho, daquela ocasião, com certeza são
válidas para os cristãos de todos os tempos. Assim ele diz:
“Tu sentes bem-estar?
Faze pouco caso disto, e tu haverás de tê-lo. Tu negas a Cristo, com medo de estragar
tua amizade com os homens; confessa Cristo, e desfrutarás a amizade na cidade
dos anjos, a cidade dos patriarcas, a cidade dos profetas, a cidade dos
apóstolos, a cidade de todos os mártires, a cidade de todos os crentes fiéis.”
Agostinho disse essas
palavras a pessoas que talvez não as entenderiam porque não sofriam
perseguição. Assim como eu faço agora. Talvez essas palavras não tenham muito
impacto nas nossas vidas porque não estamos a viver grandes perseguições. Mas
por quanto tempo? E quanto aos nossos filhos e netos? O nosso ensino e exemplo
têm sido para que eles aprendam a viver neste mundo, o que é importante. Mas
temos nos dedicado a ensinar-lhes a Palavra de Deus de tal modo que eles
prefiram morrer por ela do que viver sem Cristo?
Ninguém precisa temer
nem desanimar. O Senhor da Igreja prometeu que nem mesmo as portas do inferno
prevalecerão contra ela.
Os mártires não foram
e nem são pessoas mais santas do que nós. Mas, sem dúvida, olhando para eles
sempre sob a sombra da cruz de Cristo, podemos vê-los como exemplos de cristãos
que, com robusta fé e vívida esperança alcançaram a coroa da vida eterna
mediante a fé no salvador Jesus Cristo.
Possamos nós também
estarmos determinados e engajados no trabalho no reino de Deus, procurando, com
tudo o que somos e temos, nas nossas palavras e ações, testemunhar e confessar
que Jesus morreu para a nossa salvação. E quando ele nos vier chamar para junto
de si, estejamos a celebrar a vitória de Cristo sobre a morte. Amém.
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